Laboratório de Saúde Mental > Projeto de Pesquisa. A Reforma Psiquiátrica Brasileira
Pesquisadores responsáveis:
Manoel Tosta Berlinck,
 sociólogo, psicanalista, Ph.D. pela Cornell University, Professor 
aposentado da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), Professor do 
Programa de Estudos Pós-Graduados em Psicologia Clínica da Pontifícia 
Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), onde dirige o Laboratório 
de Psicopatologia Fundamental, presidente da Associação Universitária de
 Pesquisa em Psicopatologia Fundamental (2002 – 2004 e 2006 – 2008), 
editor responsável de Pulsional Revista de Psicanálise e da Revista 
Latinoamericana de Psicopatologia Fundamental, diretor da Livraria 
Pulsional – Centro de Psicanálise e da Editora Escuta.
Ana Cecília Magtaz Scazufca,
 psicóloga, psicanalista, doutoranda no Laboratório de Psicopatologia 
Fundamental do Programa de Estudos Pós-Graduados em Psicologia Clínica 
da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), professora do
 Curso de Psicopatologia da Faculdade de Saúde Pública da USP, 
coordenadora do Centro de Psicanálise da Livraria Pulsional, assistente 
administrativa da Associação Universitária de Pesquisa em Psicopatologia
 Fundamental.
Mônica Teixeira, jornalista e 
psicanalista. Criou e dirige a publicação eletrônica quinzenal Inovação 
Unicamp, e os sites associados a ela. Edita a seção “Observando a 
Medicina” da Revista Latinoamericana de Psicopatologia Fundamental desde
 2001. Como jornalista de televisão, realizou a série de reportagens 
“Genoma: em busca dos sonhos da ciência”, veiculada pela TV Cultura; 
criou e dirigiu de 1995 a 97 o programa SBT Repórter. Antes, trabalhou 
na TV Globo, na Abril Vídeo e na TV Machete. Foi editora da revista 
Doçura, do grupo Pão de Açúcar. Iniciou sua carreira no jornal Ex-, da 
chamada imprensa alternativa dos anos da ditadura militar.
A Reforma Psiquiátrica Brasileira: Laboratório de Saúde Mental.
Resumo
A Reforma Psiquiátrica Brasileira, ao engendrar novos dispositivos  assistenciais e novas práticas clínicas, cria atividades práticas  anteriormente desconhecidas da saúde pública. Este projeto de pesquisa  pretende contribuir para o avanço do conhecimento dessas novas práticas  clínicas. Para tanto, propõe a criação do Laboratório de Saúde Mental,  um grupo permanente de pesquisa que reunirá trabalhadores de saúde  mental para narrarem suas vivências clínicas. Pretende-se com isso: 1.  construir um arquivo das vivências clínicas de trabalhadores de saúde  mental; 2. transformar vivências clínicas em experiências socialmente  compartilhadas e 3. criar um banco de dados sobre as práticas clínicas  no âmbito da Reforma Psiquiátrica Brasileira para uso de trabalhadores e  pesquisadores.
Introdução           
A  Reforma Psiquiátrica Brasileira é um movimento sócio político que, do  ponto de vista da gestão de políticas públicas, consubstancia-se numa  legislação em saúde mental iniciada em 1990, com a Declaração de  Caracas, aprovada por aclamação pela Conferência Regional para a  Reestruturação da Assistência Psiquiátrica dentro dos Sistemas Locais de  Saúde. No documento aprovado por aclamação na última sessão de  trabalho, no dia 14 de novembro de 1990, as organizações, associações,  autoridades de saúde, profissionais de saúde mental, legisladores e  juristas aí reunidos verificaram:
           1. Que a assistência  psiquiátrica convencional não permite alcançar objetivos compatíveis  com um atendimento comunitário descentralizado, participativo, integral,  contínuo e preventivo;
           2. Que o hospital psiquiátrico, como única modalidade assistencial, impede alcançar os objetivos já mencionados ao:
                      a) isolar os doentes do seu meio, gerando, dessa forma, maior incapacidade social;
                      b) criar condições desfavoráveis que põem em perigo os direitos humanos e civis do enfermo;
                      c)  requerer a maior parte dos recursos humanos e financeiros destinados  pelos países aos serviços de saúde mental; e
                      d)  fornecer ensino insuficientemente vinculado com as necessidades de  saúde mental das populações, dos serviços de saúde e outros setores.
Considerando,
            1. Que o Atendimento Primário de Saúde é a estratégia adotada pela  Organização Mundial da Saúde e pela Organização Pan-Americana da Saúde e  referendada pelos países membros para alcançar a meta de Saúde para  Todos, no ano 2000;
           2. Que os Sistemas Locais de Saúde  (SILOS) foram estabelecidos pelos países da região para facilitar o  alcance dessa meta, pois oferecem melhores condições para desenvolver  programas baseados nas necessidades da população de forma  descentralizada, participativa e preventiva;
           3. Que os  programas de Saúde Mental e Psiquiátrica devem adaptar-se aos  princípios e orientações que fundamentam essas estratégias e os modelos  de organização da assistência à saúde.
Declaram
             1. Que a reestruturação da assistência psiquiátrica ligada ao  Atendimento Primário da Saúde, no quadro dos Sistemas Locais de Saúde,  permite a promoção de modelos alternativos centrados na comunidade e  dentro de suas redes sociais;
            2. Que a reestruturação  da assistência psiquiátrica na região implica  revisão crítica do papel  hegemônico e centralizador do hospital psiquiátrico na prestação de  serviços;
            3. Que os recursos, cuidados e tratamentos dados devem:
                      a) salvaguardar, invariavelmente, a dignidade pessoal e os direitos humanos e civis;
                      b) estar baseados em critérios racionais e tecnicamente adequados;
                      c) propiciar a permanência do enfermo em seu meio comunitário;
           4. Que a legislação dos países deve ajustar-se de modo que
                        a) assegurem o respeito aos direitos humanos e civis dos doentes mentais;
                        b) promovam a organização de serviços comunitários de saúde mental que garantam seu cumprimento;
           5.  Que a capacitação dos recursos humanos em Saúde Mental e Psiquiátrica  deve fazer-se apontando para um modelo, cujo eixo passa pelo serviço de  saúde comunitária e propicia a internação psiquiátrica nos hospitais  gerais, de acordo com os princípios que regem e fundamentam essa  reestruturação;
           6. Que as organizações, associações e  demais participantes desta Conferência se comprometam solidariamente a  advogar e desenvolver, em seus países, programas que promovam a  reestruturação da assistência psiquiátrica e a vigilância e a defesa dos  direitos humanos dos doentes mentais, de acordo com as legislações  nacionais e respectivos compromissos internacionais.
           
O  Brasil não só é aderente a essa Declaração como a ela articula-se um  longo e conturbado movimento de trabalhadores de saúde mental que  resultou na Lei no. 9.867, de 10 de novembro de 1999.
Tal lei  permite o desenvolvimento de programas de suporte psicossocial para os  pacientes psiquiátricos em acompanhamento nos serviços comunitários.  É  um valioso instrumento para viabilizar os programas de trabalho  assistido e incluí-los na dinâmica da vida diária, em seus aspectos  econômicos e sociais. Há uma evidente analogia com as chamadas “empresas  sociais” da experiência de reforma psiquiátrica italiana.
           
Em  6 de abril de 2001, o Governo Federal promulga a lei no. 10.216 que  dispõe sobre a proteção e os direitos das pessoas portadoras de  transtornos mentais e redireciona o modelo assistencial em saúde mental.  Esse texto reflete o consenso possível sobre uma lei nacional para a  reforma psiquiátrica no Brasil.
           
Tem como base o  projeto original do deputado Paulo Delgado, e versão final modificada do  substitutivo do senador Sebastião Rocha. Inclui proposições contidas em  substitutivos anteriores favoráveis ao projeto original (dos senadores  Beni Veras e Lúcio Alcântara) ou comentários a ele (do senador Lucídio  Portella).
           
A lei redireciona o modelo da assistência  psiquiátrica, regulamenta cuidado especial com a clientela internada por  longos anos e prevê a possibilidade de punição para a internação  voluntária arbitrária ou desnecessária.
           
Em 28 de maio  de 2003, o Presidente da República assina decreto instituindo grupo de  Trabalho Interministerial para avaliar e apresentar propostas para  rever, propor e discutir a política do governo federal para a atenção a  usuários de álcool, bem como harmonizar e aperfeiçoar a legislação que  envolva o consumo e a propaganda de bebidas alcoólicas em território  nacional.
           
No dia 31 de julho de 2003, o Presidente da  República assina a lei no. 10.708 instituindo o auxílio-reabilitação  psicossocial para pacientes acometidos de transtornos mentais, egressos  de internações. Essa lei, conhecida como “Lei do Programa de Volta para  Casa”, estabelece um novo patamar na história do processo de reforma  psiquiátrica brasileira, impulsionando a desinstitucionalização de  pacientes com longo tempo de permanência em hospital psiquiátrico, pela  concessão de auxílio reabilitação psicossocial e inclusão em programas  extra-hospitalares de atenção em saúde mental.
           
Desde  1992 existem oito leis estaduais em vigor, inspiradas no Projeto de Lei  Federal do deputado Paulo Delgado. Elas são do Ceará, do Distrito  Federal, do Espírito Santo, de Minas Gerais, do Paraná, de Pernambuco,  do Rio Grande do Norte e do Rio Grande do Sul. Em todas elas está  prevista a substituição progressiva da assistência no hospital  psiquiátrico por outros dispositivos ou serviços. Há incentivos para os  centros de atenção diária, a utilização de leitos em hospitais gerais, a  notificação de internação involuntária e a definição dos direitos das  pessoas com transtornos mentais.
           
Além disso, há uma  série de Portarias do Ministério da Saúde (2004). A principal é, sem  sombra de dúvida, a Portaria Interministerial no. 628, de 2 de abril de  2002, que estabelece o Plano Nacional de Saúde no Sistema Penitenciário.  Ela define mecanismos de extensão da assistência em saúde do Sistema  Único de Saúde (SUS) aos detentos do sistema penitenciário, incluindo-se  saúde mental. Essa iniciativa inédita permite não só estender o olhar e  o cuidado em saúde mental às prisões, mas também pensar um novo modo de  lidar com a questão dos manicômios judiciários.
           
É  importante destacar também a Portaria no. 1.077, de 24 de agosto de  1999, que dispõe sobre a assistência farmacêutica na atenção  psiquiátrica e assegura medicamentos básicos de saúde mental para  usuários de serviços ambulatoriais públicos de saúde que disponham de  atenção em saúde mental. Representa um aporte efetivo e regular de  recursos financeiros para que os Estados e municípios mantenham um  programa de farmácia  básica em saúde mental.
           
As  demais Portarias visam aprimorar a Reforma Psiquiátrica Brasileira  criando e regulamentando o financiamento dos “Serviços Residenciais  Terapêuticos, determinando avaliação da assistência prestada em saúde  mental pelo SUS, estabelecendo mecanismos de supervisão continuada dos  serviços hospitalares e ambulatoriais, bem como proposição de normas  técnicas e alternativas que reforcem a continuidade dos processos de  reversão do modelo de atenção em saúde mental vigente no país; definindo  a equipe mínima dos serviços ambulatoriais especializados em saúde  mental que deve atuar na assistência e supervisão das atividades dos  Serviços Residenciais Terapêuticos; instituindo o processo sistemático e  anual de avaliação e supervisão da rede hospitalar especializada em  psiquiatria, assim como hospitais gerais com enfermarias ou leitos  psiquiátricos; estabelecendo critérios de classificação conforme porte  do estabelecimento e cumprimento dos requisitos qualitativos de  avaliação fixados pela área técnica de Saúde Mental do Ministério da  Saúde quanto ao processo terapêutico e ANVISA para análise da área de  vigilância sanitária; estabelecendo classificação baseada no porte do  hospital e na qualidade do atendimento prestado, a portaria GM no. 799  de 19 de julho de 2000 tem o objetivo de reestruturar todo o sistema  hospitalar psiquiátrico, buscando nova configuração formada por  hospitais de pequeno (até 80 leitos) e médio (até 160 leitos) portes,  com redução progressiva dos leitos e melhora na qualidade da assistência  hospitalar psiquiátrica.
           
A Portaria GM no. 336, de 19  de fevereiro de 2002, acrescenta novos parâmetros à Portaria 224, de  1992, para a área ambulatorial (CAPS – Centros de Atenção Psicossocial),  ampliando a abrangência dos serviços substitutivos de atenção diária,  estabelecendo portes diferenciados a partir de critérios populacionais e  direcionando novos serviços específicos para área de álcool e outras  drogas e infância e adolescência. Cria, ainda, mecanismos de  funcionamento próprio, para além dos tetos financeiros municipais para a  rede de CAPS.
           
Em resumo, o que se observa é que o  período de 1990 a 2003 concentra a máxima intensidade política e  normativa do que se chama a Reforma Psiquiátrica Brasileira. Um ano  antes, em 1989, iniciara-se a experiência decisiva em Santos, sob a  liderança de David Capistrano Filho. Também no final desse mesmo ano,  deu entrada no Congresso Nacional o projeto de lei que resultou, 12 anos  depois, na lei brasileira de reforma psiquiátrica. Já em 1987, em um  casarão próximo da Avenida Paulista, havia sido criado o primeiro Centro  de Atenção Psicossocial, nome que naquele momento significava muito  pouca coisa, e que veio a ser o primeiro CAPS.
           
O  período tratado aqui, portanto, foi antecedido por fatos políticos muito  relevantes, especialmente nos anos de 1987 e 1989. Assim, depois da  década de 1980, marcada pela “reforma do asilo” e pela  “ambulatorização”, mas que teve pouca influência na mudança efetiva do  modelo assistencial, iniciam-se os dez anos cruciais da Reforma  brasileira. No ambiente favorável dos debates sobre a utopia da  sociedade sem manicômios, catalisados pela discussão parlamentar da lei  que propunha a “extinção progressiva” do modelo hospitalocêntrico, o  Estado foi finalmente cumprindo sua parte. Normas foram surgindo,  decisões foram sendo tomadas, e enfrentamento eternamente adiados –  especialmente com o aparato hospitalar – passaram a ser o quotidiano dos  gestores e militantes que assumiam a causa da Reforma.
           
Entre  1991 e 1995, o Ministério da Saúde  assumiu seu papel de ir definindo  os rumos de uma reforma psiquiátrica que garantisse a construção da rede  de serviços capaz de substituir eficazmente o sistema  hospitalocêntrico. Algumas normas (como a Portaria SNAS no. 224, de 29  de janeiro de 1992) tiveram importante impacto e eficácia. Ao mesmo  tempo, diversos Estados, começando pelo Rio Grande do Sul, foram  aprovando projetos de reforma psiquiátrica, na esteira da lei federal  proposta pelo deputado Paulo Delgado (PT-MG).
           
Não foi  um caminho fácil – diversos projetos de lei anti-reforma tentaram se  consolidar e no campo governamental, também, contra-normas buscaram  prosperar – nesse período extremamente fértil e contraditório de luta,  em que se buscou esculpir a superestrutura jurídica (leis e normas) da  luta política pela sociedade sem manicômio.
           
Nesse processo, podem ser destacadas:
           1.  a Portaria no. 224, de 1992, produzindo uma regra clara sobre como  devia ser a assistência hospitalar e definia os hospitais-dia e o  “atendimento em centro de atenção psicossocial” criando novos  procedimentos a serem remunerados pelo SUS;
2. o texto da Lei no.  10.216, o primeiro documento que rege todos os trabalhadores de saúde  mental e que constitui a base legal de todas as iniciativas da Reforma;
           3.  as Portarias no. 336 e no. 251. A Portaria no. 336, resultado de um  longo e coletivo processo de revisão da histórica 224, estabeleceu a  tipologia dos CAPS, distinguindo os CAPS pelo porte (I, II e III) e pela  finalidade (infanto-juvenis e álcool/drogas). O CAPS III funcionando 24  horas, não se distinguia apenas pela maior complexidade, mas  principalmente pelo potencial estratégico de substituição do modelo  hospitalar, em especial nas cidades de maior porte, consolidando, no  plano normativo, a experiência exitosa dos NAPS de Santos e de outros  municípios. Já os CAPS para “I” e “AD” constituíam inovações  tecnológicas importantes. Importa ressaltar também a criação da  tipologia “intensivo”, “semi-intensivo” e “não-intensivo”, um esforço  necessário de introduzir um pouco de variável clínica na inevitável  rigidez de uma portaria ministerial;
           4. No caso da  política de álcool e outras drogas, a Portaria no. 816, de abril de  2002, de fato inaugurava um programa sistemático de implantação de rede  assistencial destinada a esta clínica no âmbito da saúde pública;
           5.  Já a Portaria no. 251, substituindo a 469, que teve vida curta por  revelar-se inadequada, criava pela primeira vez uma regra clara de  avaliação anual dos hospitais (“PNASH Psiquiatria”) e vinculava o valor  das diárias hospitalares a duas variáveis, simultaneamente: o porte dos  hospitais (leitos existentes) e a pontuação obtida no  PNASH-Psiquiatria);
           6. a Lei no. 10.708 instituindo o Programa De Volta para Casa;
           7.  as Portarias GM no. 52 e no. 53, de janeiro de 2004, instituindo o  Programa Anual de Reestruturação da Assistência Hospitalar Psiquiátrica  no SUS, que estabelecem a estratégia de redução progressiva de leitos  nos hospitais de maior porte, aprofundando o alcance das normas  anteriores para o sistema hospitalar, especialmente a Portaria no. 251, e  reforçando o PNASH-Psiquiatria.
           8. a Lei no. 11.343,  de agosto de 2006, que muda a lei no. 6.368 de 1976, instituindo  o  Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas, o SISNAD, e  trazendo algumas alterações importantes no tratamento dado aos usuários e  traficantes de entorpecentes no País.
Práticas
A  Reforma Psiquiátrica Brasileira realiza, através de uma complexa e  sistemática política pública, consubstanciada em leis e portarias  ministeriais, leis estaduais e municipais, uma ampla modificação no  atendimento ao usuário: redireciona o modelo da assistência  psiquiátrica; regulamenta cuidado especial com a clientela internada por  longos anos e prevê possibilidade de punição para a internação  involuntária ou desnecessária; impulsiona a desinstitucionalização de  pacientes com longo tempo de permanência em hospital psiquiátrico, pela  concessão de auxílio reabilitação psicossocial e inclusão em programas  extra-hospitalares de atenção; inclui assistência de saúde mental para  os detentos do sistema penitenciário possibilitando o pensamento sobre  um novo modo de lidar com a questão dos manicômios judiciários; dispõe  sobre assistência farmacêutica na atenção psiquiátrica e assegura  medicamentos básicos de saúde mental para usuários de serviços  ambulatoriais públicos de saúde que disponham de atenção em saúde mental  etc. Em outras palavras, a Reforma formula, cria condições e institui  novas práticas terapêuticas visando a inclusão do usuário em saúde  mental na sociedade e na cultura.
O sucesso da Reforma depende,  portanto, de novas formas de clinicar e praticar a psicoterapia, e supõe  que o trabalhador em saúde mental esteja preparado para realizar essas  atividades.
Sabe-se, entretanto, que entre o código e a prática  há uma distância que nem sempre se revela nos relatórios oficiais  encaminhados periódica e sistematicamente ao Ministério da Saúde.
Além  disso, sabe-se, também, que o ensino universitário ainda não se adaptou  a essa política pública havendo uma defasagem entre formação  universitária e os requisitos advindos da prática.
Finalmente, o  sistema universitário tende a oferecer um ensino geral e abstrato que é  rico de conteúdo, mas que ignora, em grande parte, as especificidades da  Reforma Psiquiátrica e o trabalho que nesse âmbito vem sendo realizado.
Objetivos           
Tendo  engendrado novos dispositivos e novas práticas clínicas, a Reforma  Psiquiátrica criou vivências – atividades eminentemente práticas –  anteriormente desconhecidas da saúde pública. Entretanto, essas  vivências correm o grave risco de se circunscreverem ao específico  âmbito de sua prática criando uma sub-cultura na sociedade brasileira.  Ocorreria, assim, um fracasso da própria Reforma, cujo principal  objetivo é a integração desse sistema – e não apenas dos usuários – na  sociedade democrática e cidadã que se caracteriza pelo livre intercâmbio  biológico, psíquico e social.
           
Assim, tendo engendrado  novas práticas clínicas visando a integração dos usuários na sociedade e  na cultura, a Reforma Psiquiátrica Brasileira precisa, também, criar um  dispositivo para que tais vivências se transformem em experiências, ou  seja, em saberes socialmente compartilhados, desenvolvendo capacidades  de pesquisa em saúde mental.
A complexa prática engendrada pela  Reforma não afeta apenas os usuários. Os trabalhadores de saúde mental,  profundamente envolvidos nesse processo, são personagens tão importantes  quanto os usuários e suas vivências precisam ser conhecidas para que a  Reforma possa ser aprimorada e atingir seus objetivos.
Para que  isso ocorra, é necessário que as vivências eminentemente práticas dos  trabalhadores de saúde mental sejam narradas e registradas constituindo,  dessa forma, um arquivo, parte fundamental da memória das práticas  promovidas pela Reforma. Em outras palavras, é necessária a realização  de um trabalho de autoria junto aos trabalhadores de saúde mental, que  implique um processo de transformação das vivências em experiências,  passando pela narrativa escrita, pelo registro narrativo da prática.
           
Tal  atividade requer um dispositivo apropriado. Assim como foram  necessários novos dispositivos clínicos é necessária, agora, a criação  de um outro dispositivo que engendre a narrativa escrita de vivências  clínicas, a criação de um arquivo e de divulgação dessas mesmas  narrativas para que os trabalhadores se tornem autores da própria  Reforma e a sociedade fique sabendo o que ocorre com a Reforma.
           
Esse dispositivo – chamado de Laboratório de Saúde Mental – será um local (tório) de trabalho (labor) onde  trabalhadores de saúde mental possam, durante um certo período,  rememorar e escrever, de forma narrativa, aquilo que viveram na prática.
           
O  principal objetivo do Laboratório de Saúde Mental será, então, o de  possibilitar a produção de textos narrativos escritos por trabalhadores,  sobre o vivido na prática, sua impressão e divulgação. Esses textos  seriam publicados e divulgados não só entre os trabalhadores de saúde  mental, mas, também, na sociedade.
           
Os textos não serão  nem teóricos nem “universitários” (com formato de dissertação de  Mestrado ou tese de Doutorado). Aproximar-se-ão, porém, de ensaios,  artigos que podem ser publicados tanto em revistas científicas, como a Revista Latinoamericana de Psicopatologia Fundamental, órgão oficial da Associação Universitária de Pesquisa em Psicopatologia Fundamental, quanto em portal de conteúdo.
           
Outra conseqüência dessa atividade será  a produção de um dispositivo defeedback para  o Ministério da Saúde e para as Secretarias estaduais e municipais de  saúde, que poderão se beneficiar visando o aperfeiçoamento da política  pública em saúde mental. Trata-se, assim, de um dispositivo que  permitirá aumentar a capacidade de implementação da própria Reforma.
           
Finalmente,  outra conseqüência desse trabalho será o aperfeiçoamento dos  trabalhadores de saúde mental, através da produção de uma autoria e do  conhecimento que emergirá das próprias narrativas sobre a prática.  Apesar de ser elaborado num ambiente científico e universitário, não se  pretende ensinar os trabalhadores de saúde mental, mas fazer com que as  narrativas produzidas sirvam como importantes subsídios para o  aperfeiçoamento do trabalho, inclusive universitário. Eventualmente,  trabalhadores de saúde mental e universitários poderão se servir dessas  narrativas para elaborarem textos mais abstratos e gerais, mais técnicos  e teóricos, como ocorre normalmente nas universidades. Assim, neste  projeto, os trabalhadores ensinarão os universitários e os  universitários aprenderão com os trabalhadores através de uma troca  responsável.
           
Haverá, conseqüentemente, um processo de  aperfeiçoamento do pessoal de ensino superior junto com o  aperfeiçoamento dos trabalhadores de saúde mental.
O Laboratório de Saúde Mental
O  Laboratório de Saúde Mental será um dispositivo que funcionará no  âmbito da Associação Universitária de Pesquisa em Psicopatologia  Fundamental e por ela será administrado.
A Associação  Universitária de Pesquisa em Psicopatologia Fundamental é uma sociedade  científica sem fins lucrativos que reúne, atualmente (2007), 48  professores doutores de 23 universidades brasileiras e de universidades  da Argentina, da Colômbia, do México, de Cuba e da França. Sua sede fica  na cidade de São Paulo, onde o Laboratório de Saúde Mental funcionará.  Outras informações sobre a Associação Universitária de Pesquisa em  Psicopatologia Fundamental podem ser obtidas em www.fundamentalpsychopathology.org.br
O  Laboratório de Saúde Mental terá sucessivos programas de trabalho. Cada  programa constará de grupo de até 20 trabalhadores, coordenados pelos  pesquisadores responsáveis, e será constituído mediante edital de  convocação  amplamente divulgado e processo de seleção.
           
Obrigatório: O  grupo reunir-se-á semanalmente, durante três horas, para comentar  textos preliminares e trocar informações e experiências práticas e  teóricas. O tempo restante será utilizado em leituras, cursos e outras  atividades culturais voltadas para a constituição da autoria.
           
Optativo:Além  disso, os trabalhadores poderão freqüentar as atividades do Laboratório  de Psicopatologia Fundamental do Programa de Estudos Pós-Graduados em  Psicologia Clínica da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo,  onde o trabalho de autoria é realizado a nível de Aperfeiçoamento,  Mestrado, Doutorado e Pós-Doutorado, há cerca de 11 anos. Outras  informações sobre o Laboratório podem ser obtidas em www.psicopatologiafundamental.org.br
Os  ensaios produzidos serão publicados e amplamente distribuídos, ainda  sob a supervisão da Associação. A publicação poderá ser feita tanto sob a  forma de artigo em Revista científica ou em livro, quanto em portal na  Web.
           
O Laboratório promoverá, periodicamente, uma  avaliação interna e externa dessa atividade para corrigir eventuais  defeitos e aprimorar sua própria experiência. Promoverá, finalmente,  Encontros Nacionais onde os trabalhos realizados serão apresentados e  comentados por profissionais renomados.
Público-alvo:
Psicólogos,  médicos, terapeutas ocupacionais e assistentes sociais que façam ou  fizeram parte de equipes de saúde mental articuladas aos Centros de  Atenção Psicossocial (CAPS), aos Serviços Residenciais Terapêuticos  (SRT), ao trabalho na atenção básica, leitos em hospitais gerais,  ambulatórios e ao Programa “De Volta Para Casa”.
Duração:           
O  primeiro programa de trabalho do Laboratório de Saúde Mental terá  início no dia 1 de agosto de 2007 e terminará no dia 28 de novembro de  2007.
           
Durante esse período ele funcionará semanalmente, às 4as feiras, das 9:00 às 12:00 horas.
           
Além  disso, é aconselhável que os pesquisadores do Laboratório reservem pelo  menos duas horas semanais para estudo dirigido e outras atividades de  ensino e pesquisa.
           
A versão definitiva dos ensaios  deverá ser entregue na sede da Associação Universitária de Pesquisa em  Psicopatologia Fundamental até o dia 2 de janeiro de 2008.
           
Após  a entrega do ensaio, o pesquisador receberá um certificado de  participação e conclusão do programa emitido pela Associação  Universitária de Pesquisa em Psicopatologia Fundamental.
É  permitido ao pesquisador se matricular no próximo programa do  Laboratório de Saúde Mental desde que se submeta ao subseqüente processo  seletivo.
Cronograma
1 de março de 2007
–  Divulgação do Projeto e edital de convocação através do portal da  Associação Universitária de Pesquisa em Psicopatologia Fundamental www.fundamentalpsychopathology.org.br e da mala direta eletrônica da Livraria Pulsional.
20 de junho de 2007
– Data-limite para postagem de inscrições
2 a 6 de julho de 2007
– Seleção dos candidatos da primeira turma do Laboratório de Saúde Mental.
9 a 16 de julho de 2007
– Comunicação do resultado do processo seletivo.
1 de agosto de 2007
– Início das atividades da primeira turma do Laboratório de Saúde Mental.
28 de novembro de 2007
– Conclusão das atividades de ensino e pesquisa do primeiro Laboratório de Saúde Mental.
2 de janeiro de 2008
– Data-limite para a entrega da versão definitiva do ensaio.
4 de fevereiro de 2008
– Emissão e entrega dos certificados aos participantes do primeiro Laboratório de Saúde Mental
Referências
Ministério da Saúde. Legislação em saúde mental. 1990 – 2004. 5ª. ed.ampliada. Brasília: Ministério da Saúde, 2004.
Ministério da Saúde. Saúde Mental e Economia Solidária. Brasília: Ministério da Saúde, 2005.
Ministério da Saúde. Reforma  Psiquiátrica e política de Saúde Mental no Brasil. Conferência Regional  de Reforma dos Serviços de Saúde Mental – 15 anos depois de Caracas. Brasília: Ministério da Saúde, novembro de 2005.
Outras informações sobre a Reforma Psiquiátrica Brasileira podem ser obtidas em:
Ministério da Saúde
Secretaria de Atenção à Saúde
Departamento de Ações Programáticas Estratégicas
Coordenação de Saúde Mental
Esplana dos Ministérios
CEP: 70058-900 Brasília, DF
Tels.: 55 61 33.15.23.13 ou 33.15.26.84 ou 33.15.26.55
Fax.: 55 61 33.15.23.13
E-mail:
saudemental@saude.gov.br
Portal:
www.saude.gov.br /
www.pvc.datasus.gov.br
